Jards Macalé comemora 80 anos com o lançamento do álbum Coração Bifurcado, dedicado à Gal Costa. “É um álbum amoroso. É ela”, conta Macalé ao Apple Music, referindo-se à amiga de longa data que faleceu em 2022. O projeto traz as participações de Ná Ozzetti, Maria Bethânia e Nara Leão (em memória), com direção artística de Romulo Fróes, com quem Macalé já havia trabalhado em Besta Fera(2019). Coração Bifurcado foi gestado durante o período de transição entre governos após as turbulentas eleições de 2022. “Famílias começaram a brigar, pais e filhos ficaram sem se falar. Então eu senti necessidade de sublinhar o amor como um gesto político. As 12 faixas são como 12 personagens: cada uma fala sobre um sentimento amoroso em forma de música”, explica o artista. Os responsáveis por traduzir esses desejos em poesia foram Alice Coutinho, José Carlos Capinam, Rodrigo Campos, Clima e Ronaldo Bastos. Entre os instrumentistas estão Guilherme Held (guitarra), Pedro Dantas (baixo), Rodrigo Campos (violão, cavaquinho e percussão) e Thomas Harres (bateria). Os arranjos de metais são assinados por Antônio Neves e as orquestrações, por Cristóvão Bastos. A seguir, Jards Macalé comenta cada uma das músicas de Coração Bifurcado: Amor In Natura “Durante a pandemia [de covid-19], eu comecei a revirar alguns papéis, mexer em lembranças, e encontrei essa música na pasta de letras do [poeta e músico José Carlos] Capinam – aqui em casa, cada autor tem uma pastinha, como Waly Salomão, Duda Machado e Xico Chaves. Peguei essa letra que eu tinha guardada há muito tempo e a musiquei.” Coração Bifurcado “A letra é do Kiko Dinucci. Eu e ele somos ligados a religiões de matriz africana. Eu me aproximei ainda mais da umbanda quando fiz a trilha sonora do filme Amuleto de Ogum (1974) e do candomblé quando trabalhei no longa Tenda dos Milagres (1977), ambos dirigidos por Nelson Pereira dos Santos. Por isso, eu já tinha essa pesquisa enorme, tanto no Rio de Janeiro quanto na Bahia. Dinucci me enviou uma letra que falava sobre a ‘encruzilhada’, que é aquele momento em que a gente precisa escolher um caminho. E eu até brinquei com ele e disse que essa música é da Pombagira. E é também do Zé Pilintra, uma entidade que abre caminhos, mas também pode fechar. As filhas e as netas de Martinho da Vila [Analimar Ventapane, Dandara Ventapane e Maíra Freitas] interpretaram o coro de vozes femininas.” A Arte de Não Morrer “Esta é outra do Capinam. Durante a pandemia, ele publicou muitos poemas nas redes sociais. Ele é um grande escritor e tem essa capacidade imensa de produzir. A vida dele é a poesia. Eu mandei uma mensagem para ele e disse: ‘Essa é nossa’.” Mistérios do Nosso Amor “A letra é do Ronaldo Bastos interpretada por Maria Bethânia. Quando ela veio para o Rio de Janeiro, nos anos 60, foi morar lá em casa. Nós cantávamos dia e noite. Ela substituiu Nara Leão no espetáculo musical Opinião, no qual eu era o violonista. Foi uma peça importantíssima na época, dirigida pelo Augusto Boal. E eu fui o diretor musical do primeiro show individual dela, na boate Cangaceiro. Além da amizade antiga, nós já fizemos muitos trabalhos juntos.” Grãos de Açúcar “A autora desta música é Alice Coutinho, que também escreveu a letra de ‘A Mulher do Fim do Mundo’, da Elza Soares. Eu a interpreto de uma forma meio ‘jobiniana’: a melodia, ao estilo Tom Jobim, ficou lindíssima. É uma das minhas interpretações de que mais gosto no álbum. Vai viajando na melodia e na letra.” O Amor Vem da Paz “É mais uma música escrita pelo Ronaldo Bastos e foi feita especialmente para a minha esposa, Rejane Zilles. É toda dedicada a ela.” Amo Tanto “Esta composição, letra e música, foi uma pequena seresta que eu fiz quando tinha 15 anos. Naquela época, todo mundo queria ser o Vinícius de Moraes, por isso ela ficou assim. Nara Leão a gravou no álbum Nara Pede Passagem, de 1966, e optei por colocar a mesma versão. Além de Nara interpretá-la lindamente, ainda tem as participações de Dino 7 Cordas, que foi pioneiro em desenvolver essa linguagem e técnica; de Meira [Jayme Thomás Florence], que foi meu professor de violão; de Baden Powell; e do meu amigo Copinha [Nicolino Copia] na flauta.” A Foto do Amor “A letra é do Rodrigo Campos. Eu mandei para ele uma música rudimentar, meio balada, meio pop rock. E a ideia que ele teve foi engraçada. É sobre uma relação entre três moradores de rua, embaixo de um elevado em São Paulo. De repente, um argentino passa e tira uma foto. E ela acabou virando uma espécie de rap. Eu nunca fiz rap, mas fiz muito samba de breque com o Moreira da Silva. O que na verdade é uma espécie de rap, porque a gente coloca ‘o fato na fala’. Então, digamos que seja um rap.” Pra um Novo Amor Chegar “Esta é do Romulo Fróes, um artista formidável. O violão é tocado por mim, mas quem iniciou a base de acordes e tocou as guitarras foi o Guilherme Held, outro grande músico que potencializa o meu trabalho.” Simples Assim “A composição é minha, do Guilherme Held e do Romulo Fróes. Foi feita para a Gal Costa. Já estávamos trocando mensagens e tínhamos marcado a data da gravação. Ela tinha a letra na ponta da língua, mas, infelizmente, partiu antes de isso acontecer. Então, eu convidei Ná Ozzetti para interpretá-la, outra cantora que faz parte da minha trajetória e que admiro muito.” Você Vai Rir “A letra é do Clima [compositor e artista plástico Eduardo Climachauska]. Fala sobre um cara que está sem grana e vai morar no apartamento de um amigo. Mas o amigo volta para casa e ele precisa sair de lá. Então, ele fica entre dormir no banco do bonde ou no banco da praça. É mais uma música dedicada aos moradores de rua.” Cante “Letra e música são minhas. É um elogio ao canto. Eu fiz para comentar o álbum todo, porque a melhor coisa do mundo, além do amor, é cantar.”
Videoclipes
- Itamar Assumpção
- Luiz Melodia
- Sergio Sampaio